O pastel de vento é demonstrativo da banalização em que caíram as delações

Elio Gaspari – Folha de S.Paulo

A colaboração de Sérgio Cabral com o Ministério Público do Rio e com o juiz Marcelo Bretas virou conversa de botequim. Até agora, suas confissões confirmam que ele corrompeu o mandato de governador do Rio, mas isso já se sabia, pois está condenado a 198 anos de prisão.

Num depoimento espetaculoso, Cabral contou que em 2011 o chefe de sua Casa Civil, Régis Fichtner, pressionou-o, até com “ameaça”, para que seu cunhado, o desembargador Marco Aurélio Bellizze, fosse nomeado para uma vaga no Superior Tribunal de Justiça, atropelando a candidatura do advogado Rodrigo Candido de Oliveira, sócio do escritório da mulher de Cabral.

O juiz Bretas e o meio jurídico sabem que uma nomeação nada teve a ver diretamente com a outra. Belizze foi escolhido para uma vaga de magistrado, e Rodrigo disputava uma cadeira dos advogados. Ademais, quem nomeia ministros para o STJ é o presidente da República, e Bellizze tinha currículo que superava o parentesco.

O ex-governador disse ao juiz Bretas que foi obrigado a fazer “esse papelão de barrar o sócio de minha esposa”. Colocou-se em outro papelão ao embaralhar os fatos. Os dois disputavam páreos diferentes em ocasiões diferentes, Rodrigo perdeu em abril e Bellizze ganhou em julho. A farofa leva água para a suspeita de que Cabral instrumentaliza suas confissões pelos ventos da política do Rio de Janeiro.

O pastel de vento é demonstrativo da banalização em que caíram as delações. Quando Cabral, o Magnífico Gestor, fez coisas que nem Asmodeu imaginava, tudo parecia normal. Agora, quando Cabral, o Penitente, confessa seu “papelão”, busca crédito de virgem.

Olhando-se para trás, quando Antônio Palocci era o quindim da banca, viam-no como um grande ministro da Fazenda. Apenado, tornou-se uma fábrica de delações espetaculares, vazias de provas. Ele contou que foi nomeado gerente de uma caixinha de empreiteiras, o que pode ser verdade, mas não se sabe ainda como recolheu o dinheiro nem como o distribuiu.

A divulgação do anexo de Palocci pelo juiz Sergio Moro foi instrumentalizada na campanha eleitoral do ano passado. O Rio não precisa que mais essa praga entre na sua política.