“Aliás, por tudo o que tem sido dito e especulado, o que fica de verdade como real motivo pela minha exoneração, não são ajustes administrativos, mas, sim, um ajuste partidário e eleitoreiro, para perpetuar os desajustes que tanto maculam o nosso ambiente político. Isso me fez perceber, ainda com mais clareza, a urgência de uma verdadeira reforma política. Inclusive, é preciso não somente uma reforma, mas também é preciso mudar a forma de se fazer política no Brasil. Não é mudar apenas o nome, mas, sim, as práticas.”

“AJUSTES ADMINISTRATIVOS”

Por Túlio Gadelha

Na sexta-feira, 19 de janeiro de 2018, tomei ciência, por telefone, da minha exoneração do Instituto de Terras e Reforma Agrária de Pernambuco (ITERPE). Pelo trabalho que vínhamos desempenhando e por muito o que tínhamos como compromisso para firmar, o sentimento de frustração me visita. Ao mesmo tempo, sou grato pelos 79 dias de serviço prestado a esse povo de mãos calejadas. Muito trabalho ainda há por fazer para que a população camponesa viva com dignidade e justiça, mas entrego o ITERPE com a serenidade de quem prezou por sua missão: regularização fundiária, aquisição e redistribuição de terras, investimentos produtivos e de infraestrutura nos assentamentos públicos estaduais.

Um seminário de avaliação e planejamento marcou o início da minha gestão. Dediquei-me  a escutar e entender o servidor da sede e de cada unidade regional, e assim, construir uma gestão participativa e horizontal. Entre as ações realizadas, cito: a) visita e fiscalização de assentamentos de todas as regiões do Estado; b) assinatura de convênios que beneficiarão milhares de pessoas com acesso à terra, água e assistência técnica; c) liberação de recursos através do Banco do Nordeste para o desenvolvimento de dezenas de unidades produtivas; d) retomada do Programa de Crédito Fundiário, depois de anos inerte; e) construção de um plano de trabalho para emissão e regularização do CAR (Cadastro Ambiental Rural) em todos assentamentos; f) estudo para identificação dos assentamentos mais necessitados para reconhecimento junto ao INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e posterior liberação de crédito para atividades agrícolas; g) medição e demarcação  de centenas de áreas para a regularização fundiária; h) composição de uma comissão para resolução de conflitos agrários; i) assinatura de convênio com o Governo Federal para a reestruturação da frota de veículos do Instituto; j) início das notificações extrajudiciais aos parceleiros irregulares, de pessoas tidas como assentadas, que estão em posse da terra, mas que não preenchem os pré-requisitos socioeconômico estarem lá.  Além disso, demonstramos a necessidade de instalar o ITERPE em estruturas mais adequadas, visando a saúde, segurança e valorização do servidor, mudança que deve acontecer em fevereiro.

Em pouco mais de dois meses de gestão, vi o que parece ser pouco se transformar em muito. Nesse período de intenso trabalho e entrega, encontrei em cada camponês e camponesa um professor e uma professora. Passei a compreender, ainda com mais força, as necessidades ancestrais que permeiam a vida daquelas e daqueles que enxergam no meio rural a sua identidade e a sua dignidade.

Aliás, por tudo o que tem sido dito e especulado, o que fica de verdade como real motivo pela minha exoneração, não são ajustes administrativos, mas, sim, um ajuste partidário e eleitoreiro, para perpetuar os desajustes que tanto maculam o nosso ambiente político. Isso me fez perceber, ainda com mais clareza, a urgência de uma verdadeira reforma política. Inclusive, é preciso não somente uma reforma, mas também é preciso mudar a forma de se fazer política no Brasil. Não é mudar apenas o nome, mas, sim, as práticas.

A política deve servir para organizar a sociedade com representantes comprometidos em fazer uma gestão do bem público para o público e com qualidade. Representantes conscientes de que o acesso à terra, saúde, educação, transporte, cultura são direitos inalienáveis, e não mercadorias ou moeda de troca para obtenção de votos. É essa a política que eu faço: comprometida com os interesses do público e das pessoas comuns que constroem o nosso país.

A minha trajetória demonstra o quanto concordo com Francisco Julião: “É agitando que se transforma a vida, o homem, a sociedade, o mundo. O crime não está em agitar, mas em permanecer imóvel”, pensamento registrado durante exílio no México, no período da Ditadura Militar no Brasil (1964 – 1985).

É preciso unir a política à moral e à ética. Isso faz com que o Estado tenha como virtude assegurar acesso a direitos, não só de forma igualitária, mas, principalmente, equitativa, cuidando primeiro de quem precisa mais. É natural de quem constrói consciência a luta contra as opressões, atuando de forma ética em cada espaço ocupado, nas ruas e nas instituições.

Sonho, acordo e entrego meu corpo à luta por um estado assentado na ética, na transparência, na garantia dos direitos, na laicidade, fazendo um trabalho para a coletividade. Essa é a agitação que eu quero fazer. Uma agitação que transforma a vida do nosso povo com dignidade. Outra política não me interessa.

A todas e todos que estiveram comigo, meu mais profundo agradecimento. As necessidades vistas e sentidas, reforçam ainda mais o compromisso de continuar a luta por melhorias na vida de cada mulher e de cada homem do campo que conheci.