Professores precisam estar preparados para identificar diferenças

As estatísticas atuais sobre alfabetização no Brasil preocupam. Segundo resultados mais recentes da Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA), 54,73% de mais de 2 milhões de alunos concluintes do 3º ano do Ensino Fundamental apresentaram desempenho insuficiente no exame de proficiência em leitura. Em escrita, 33,95% ficaram em nível insuficiente e 54,46% apresentaram desempenho abaixo do adequado em Matemática.

Com a meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (PNE), de alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3º ano do Ensino Fundamental, esses números demonstram a necessidade de maior atenção para os diferentes métodos de alfabetização utilizada nas escolas brasileiras. “É importante entender o percurso de alfabetização trilhado por cada crianças e observar o tempo e o ritmo de aprendizagem de cada uma delas”, expõe Rita Schane, especialista em pareceres pedagógicos da Aprende Brasil, editora responsável pelo Letrix, um programa de letramento e alfabetização voltado para alunos que ainda não estão alfabetizados no tempo convencionado pela políticas educacionais, ou que apresentam defasagem nos processos de leitura e escrita.

Além das dificuldades relacionadas ao processo pedagógico, existem crianças que possuem necessidades educativas diferenciadas por conta de distúrbios de aprendizagem, como a discalculia, a disgrafia, a dislexia, entre outros. Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, publicado pela Associação Psiquiátrica Americana, os distúrbios de aprendizagem acometem de 5 a 15% das crianças em idade escolar, em diferentes idiomas e culturas, sendo em leitura e escrita os mais comuns. “Frente a esses dados, percebemos que, obviamente, não podemos culpabilizar os distúrbios de aprendizagem por todo o índice de desconformidade e dificuldades de alfabetização”, evidencia Rita.

Porém, por entender que há algum problema mais sério que afeta esse contingente de estudantes fora da linha esperada de alfabetização, as instituições de ensino, muitas vezes, os encaminham a consultórios terapêuticos. Quando chegam aos consultórios, no entanto, poucos são os alunos diagnosticados com transtornos ou disfunções cognitivas. O problema é mais simples do que se imagina: os métodos utilizados para a alfabetização não foram adequados ou não respeitaram o seu tempo ou ritmo. “Alguns professores desconhecem o caminho que os alunos vêm percorrendo no processo de alfabetização, classificam as dificuldades encontradas como problemas que a escola não pode sanar e os encaminham para um psicólogo ou fonoaudiólogo, quando na verdade os problemas de alfabetização podem ser sanados pela própria escola, quando não há distúrbios maiores”, explica.

“Às vezes, a criança não aprende a ler e escrever como e quando a escola espera que ela aprenda, mas é bom refletir sobre o momento em que ela se encontra, talvez não tenha superado algum estágio que faz parte de todo o processo, mas com certeza se alfabetizará”. O fato de não estar escrevendo ou lendo como a escola e a família desejam, não significa que a criança tenha um distúrbio, mas pode estar ainda em uma fase anterior à esperada, construindo o processo de escrita e de leitura. “Até porque cada criança tem seu tempo e seu ritmo de aprender. Nem todos aprendem ao mesmo tempo e da mesma forma. Entender os estágios de desenvolvimento e como se dá a aquisição da leitura e da escrita, são fatores importantes para os professores”, ressalta a especialista.

Como resolver o problema

Para Rita, uma observação mais apurada por parte dos professores quanto à forma de aprendizado de cada estudante e a oferta de metodologias diferenciadas podem contribuir com a diminuição dos índices atuais. “Se o aluno está chegando ao quarto ou quinto ano de escolaridade sem estar alfabetizado, e sem um diagnóstico de qualquer distúrbio que seja, cabe à escola dar o suporte para que ele consiga avançar essa etapa da escolaridade sem perder a motivação para aprender”, afirma. A escola pode, por exemplo, oferecer no período contraturno aulas extras para atender as necessidades desse estudante, de maneira diferenciada e em pequenos grupos. “É um direito da criança ser alfabetizada e aprender, então, a escola deve realizar um trabalho diferente de tudo aquilo que fez até então, com propostas inovadoras e mais lúdicas, que vão, mesmo que tardiamente, resgatar os princípios da alfabetização, ou seja,aquilo que ela deveria ter aprendido no primeiro ou segundo ano, de modo a recuperar a sua autoestima”, sugere Rita.

A especialista reforça ainda que a autoestima do aluno precisa ser preservada. “Se ele está com nove ou dez anos e ainda não sabe ler e escrever, ele entende que está, de alguma forma, ‘para trás’; então, a abordagem adotada pela escola deve ser de empoderamento, que o motive e desperte a vontade de aprender. Ou seja, a escola precisa estar predisposta a romper paradigmas e fazer tudo de novo, mas de um jeito diferente”, defende ela.