Celso Rocha de Barros – Folha de S.Paulo
Achei que a ideia do anti-Lula fosse contra o que Lula tinha de ruim, não de bom
Em um tuíte de 2014 —publicado pelo jornal carioca Extra em 4 de outubro de 2016 (e depois apagado sem explicações)—, Carlos Bolsonaro defendeu que o Bolsa Família só seja oferecido a quem aceitar se submeter a laqueaduras (que impediriam as brasileiras pobres de terem filhos) ou vasectomias (que impediriam os brasileiros pobres de terem filhos).
A ideia, portanto, era que as mulheres pobres que quisessem ter filhos morressem de fome com seus filhos no colo.
A principal proposta de Bolsonaro para reduzir a mortalidade infantil, a propósito, é mandar as mulheres escovarem os dentes. Pois é, ele fala essas coisas.
Mas se não tiver jeito e o pobre acabar nascendo e sobrevivendo de algum jeito, a família Bolsonaro também tem duas sugestões para ele: trabalhar ganhando menos e morrer sem ver o filho formado.
A esquerda gosta de lembrar que Bolsonaro —cujo partido, o PSL, é o mais fiel a Temer nas votações no Congresso— votou a favor da reforma trabalhista. Isso não é nada, amigos.
Bolsonaro defende a criação de uma carteira de trabalho verde-amarela, diferente da azul porque não garante nenhum direito ao trabalhador.
Os trabalhadores mais pobres, que têm menos poder de barganha, acabariam sendo obrigados a aceitar a carteira verde-amarela e perderiam seus direitos.
Essa segmentação do mercado de trabalho arrisca aumentar de novo a distância entre os pobres e a classe média, distância que caiu durante o governo Lula.
Não sei, mas acho que quando o pessoal pediu um anti-Lula, acho que a ideia era que ele fosse “anti” o que o Lula tinha de ruim, não o que ele tinha de bom.
Mas o pessoal da carteira azul também não deve se entusiasmar, não. Pois, como vimos na semana passada, o vice de Bolsonaro defende a extinção do 13º salário e das férias.
Se você for pobre, faça a conta: pegue seu salário, deduza o que você vai perder com os cortes do Mourão, subtraia a CPMF que o Guedes vai cobrar e não se esqueça de que uma arma, a única política de segurança proposta por Bolsonaro, custa bem caro.
Bom, mas se os pobres receberem educação, estarão em melhor condição de competir no mercado de trabalho, certo?
A principal proposta de Bolsonaro para a educação é militarizar o ensino, o que o Mourão já disse que não
dá para fazer.
Bolsonaro é contra as cotas, que ajudaram a aumentar o número de pobres nas universidades.
E, na sabatina do Jornal das Dez, na GloboNews, Bolsonaro reclamou da “tara” da garotada em ter um diploma.
Ninguém é mesmo obrigado a fazer faculdade. Mas a questão é que essa escolha deve ser feita com base nas preferências pessoais de cada jovem, não na classe social em que ele nasce.
E Bolsonaro não tem a menor ideia do que fazer para ajudar os filhos dos pobres a entrarem na universidade.
E aqui você poderia dizer: ah, mas no programa de governo dele tem uma proposta de renda mínima (aquela do Suplicy). Bom, vejam como Bolsonaro reagiu quando soube, pela imprensa (que bonito), que isso estava em seu programa de governo: “Meu Deus! Kkkkkkkk! É inacreditável!”.
Bolsonaro já voltou atrás em algumas dessas propostas, mas perceba o padrão: para cada ideia antipobre que ele abandona, logo cria duas novas.
E, aparentemente, o plano é mandar esse cara disputar o segundo turno contra o PT.