A Operação Cadeia Velha, desencadeada nesta terça-feira no Rio, pode representar o fim de um ciclo de poder na política fluminense. Depois das prisões do ex-governador Sergio Cabral e do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, a investigação alcançou o presidente da Assembleia do Rio, Jorge Picciani, e seu colega Paulo Melo, os dois mais influentes representantes do Parlamento do Rio. Em comum, todos os políticos investigados compuseram o núcleo do comando do PMDB fluminense na última década.

De acordo com os investigadores, Cabral não era o único chefe do esquema. Picciani e Paulo Melo também faziam parte do comando “horizontal”, formando uma verdadeira “confraria” do crime.

No MPF e na PF, os investigadores estão convencidos de que a Alerj é o epicentro do esquema de corrupção mantido pelo PMDB fluminense. Foi de lá que saiu Sergio Cabral para o Senado e, depois, para o governo do Estado. Também passou por lá o ex-deputado Eduardo Cunha.

A força-tarefa pretende avançar por etapas e fazer ações ostensivas, como prisões e apreensões.

A cena do presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani, sendo conduzido até uma viatura policial no Aeroporto Santos Dumont, na manhã de ontem, (Foto)enquanto seu filho, Felipe, era preso em Minas Gerais, espalhou incertezas nos corredores da Casa. Velhos aliados já duvidam da capacidade dos chefes políticos de protegê-los.

Um dos temores está na prisão de Jorge Luiz Ribeiro, empresário acusado de operar a propina destinada a Picciani. Na Assembleia, ele era conhecido como o homem da mala, que só aparecia em anos eleitorais para cevar de dinheiro a campanha dos aliados do presidente. Jorge não virá mais. Pior: por ser um personagem lateral, é potencialmente candidato à delação premiada.

O Ministério Público Federal sustenta que a propina foi paga por empreiteiros e empresários ligados à Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor). Picciani também é acusado de operar como intermediário na distribuição do dinheiro a outros parlamentares e de atuar como agente de lavagem de dinheiro. Melo também foi conduzido coercitivamente.

O MPF pediu ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) que determine a prisão de Picciani, Melo e do líder do governo Edson Albertassi (PMDB), por cometerem crimes em flagrante. Os procuradores sustentam que o flagrante existe porque o trio age até hoje, cometendo o crime continuado de lavagem de dinheiro. Este pedido será submetido pelo relator do caso, desembargador Abel Gomes, ao colegiado da Seção Criminal do TRF-2, formada pelos seis desembargadores das turmas de Direito Penal, em sessão especial que deve ocorrer amanhã.

O delegado Ramagem Rodrigues afirmou ontem que “o conluio criminoso se traduzia em excessivos benefícios fiscais em favor de determinadas empresas e empreiteiras, que levaram a que o estado deixasse de arrecadar em um período de cinco anos mais de R$ 183 bilhões, ocasionando o atual colapso nas finanças do estado”.

Em delação decisiva para os investigadores, o empresário Marcelo Traça Gonçalves, ex-vice do conselho de administração da Fetranspor, detalhou como os empresários do setor se organizaram para corromper deputados estaduais durante quase três décadas.

O doleiro Álvaro José Novis, dono da corretora Hoya, contou que intermediou, na condição de agente financeiro, a propina da Fetranspor entregue regularmente a Picciani. Já o ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Jonas Lopes de Carvalho, em depoimento dado no âmbito da Operação “Quinto do Ouro”, apresentou Picciani como intermediário da negociação de propina entre a federação e os conselheiros do TCE-RJ.

O Globo – Chico Otávio, Daniel Biasetto, Miguel Caballero e Juliana Castro